sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Da ilusão da maternidade e outras descobertas



Eu tinha 17 anos quando fiquei grávida. Não fui adulta antes de ser mãe.
Esse fato moldou minha vida. Alterou caminhos, abriu e fechou espaços.
Meu trajeto profissional, amoroso, familiar e social foi todo desenhado por esta condição. Mãe solteira e adolescente.

Hoje quando uma amiga me conta que está grávida tenho calafrios. Ao perceber este quase pânico que se instala em mim quando penso em outra criança chegando ao mundo, o que salta a meus olhos é o quanto de sonhos está impresso no desejo de ser mãe.


Quanta expectativa se coloca neste papel e nesta relação. 


Sempre imagino que logo esses sonhos serão balões soltos no céu e a realidade dessa escolha será um choque para todos os envolvidos.

Bom, é a partir daí que a brincadeira começa. O fim dos sonhos e a quebra de todas as expectativas é o que pode nos fazer entender a beleza e a importância de ser mãe. O crescimento radical e irreversível que é entender que “não, nossa mãe não estava errada”. Ser mãe é mesmo a tarefa mais desafiante que uma mulher pode enfrentar e não existem garantias de sucesso.

Se sonhamos que nossos filhos sejam um aperfeiçoamento de nós mesmos, que nos superem em nossas dificuldades, que sejam mais felizes que fomos, logo descobriremos que eles tem seus próprios caminhos e que estes não nos dizem respeito.

Hoje olhando para minha filha, aos 28 anos, e percebendo suas escolhas com a serenidade de quem já não precisa mais ser mãe, relaxo na confiança e na aceitação da beleza das diferenças.
Mas não foi sempre assim...

Aprendi com ela, dia a dia, que ela não seria o que eu um dia imaginei. Que não gostaria das mesmas músicas, dos mesmos filmes, não teria as mesmas ideias, não faria o que eu achasse que seria o melhor para ela, não seguiria meus conselhos, não seria um eu melhor.
Ela foi desenhando sua estrada, e eu fui aprendendo a desapegar de todas as ideias sobre o que é ser mãe, ser filha, como se dá este amor em meio a tantas dessemelhanças.
Ao mesmo tempo descobrindo as afinidades em simplesmente amar, ser presente, aceitar, divergir, e parir a cada momento as próprias expectativas, deixando que elas morram e deem lugar à fluidez da vida.

Minha filha me ensinou a respeitar o que desconheço, confiar sem saber em quê, fazer minha parte sem ter controle sobre o resultado. Me ensinou a amar sem condição. Sei que ela, tão pequena, em meu colo de adolescente foi o primeiro vislumbre de um amor que eu iria ver crescer e se transformar no próprio Amor.

E não foi fácil. Foram muitos partos, dores, dúvidas, medos, desilusões e outros tantos e belos momentos de pura alegria, descoberta, surpresa e frescor de ver uma criança descobrindo a vida.
Vê-la se tornando uma mulher, à custa da própria vida, e experiências nem sempre fáceis, também me fizeram mais mulher. O crescimento dela foi também o meu.

Hoje vejo que ela desenvolveu profundamente e me ensinou esse respeito às diferenças, e nisso as próprias diferenças desaparecem. Ao incluir a todos em seu coração ela mesma vai apagando as fronteiras de suas ideias e crescendo em direção à Ser.
Vejo uma mulher pronta a se abrir, incluir e aceitar aquilo que não se parece com ela, e assim deixando espaço para descobrir-se maior do que os limites do que conhece.

E eu continuo aprendendo, mais e mais, deixando os papéis dissolverem nesse amor, entregando as ideias e diluindo certezas.

Toda gratidão a ter sido mãe, a prática exata do desapego, de aprender que nada está em minhas mãos, de confiar, de amar...

Um comentário:

vj cambará disse...

Muito lindo! A minha filha tem só três anos e a cada ano que passa vai ficando mais evidente que ela já é um ser pronto, já está tudo ali. Eu não ensino ela a ser alguém, ela já é uma pessoa pronta com seus argumentos, personalidade e qualidades. É uma visita que recebi na minha vida e a que ajudo a crescer e se desenvolver nesse planeta. A contrapartida é esse amor incondicional que se cria nessa relação. E a grande questão é aceitar que um dia esse amor vai chegar pra mim e dizer: "pai eu to indo".